Larissa Dutra é jornalista da Phomenta
Este conteúdo foi produzido por
Larissa Dutra
No final do mês de setembro um termo se tornou amplamente discutido nas redes sociais, especialmente no Twitter: o "marmita gate". Isso porque ele se refere especialmente a um golpe de doações para a fabricação de marmitas, supostamente efetuado por uma estudante chamada Duda Poleza em Blumenau, SC.
Mas, não é de hoje que os golpes relacionados à vulnerabilidade alimentar acontecem. É comum vermos diariamente nas redes sociais relatos de pessoas que precisam de ajuda, e também de pessoas que sofreram algum tipo de golpe doando para uma organização que não existia, ou não executava de fato o que era prometido.
Em decorrência disso, as organizações do terceiro setor precisam não só continuar a execução do seu trabalho, como também se blindar contra ataques que são amplamente difundidos.
Analisar o caso "marmita gate" é uma oportunidade de entender como os golpes de doação acontecem, e quais os danos que eles podem gerar para as organizações sérias, além de mostrar quais são os passos necessários para demonstrar confiabilidade para o público.
Os estelionatários que atuam em golpes de doação sempre surfam na crista da onda, onde é mais difícil ser questionado. Em um cenário de volta ao mapa da fome, em que mais de 30 milhões de brasileiros estão em insegurança alimentar, ou seja, não sabem se vão conseguir realizar a próxima refeição, existem mil possibilidades de golpes. Isso porque é mais fácil sensibilizar e não ser questionado quando esses problemas estão nítidos.
As causas costumam ser sempre as mais urgentes, que são resolvidas em poucos dias e podem ser repetidas, como a fome. A distribuição de marmitas é uma atividade comum de quem procura atender a uma demanda social urgente.
E enquanto muitas pessoas se mobilizam de fato, outras aproveitam a “oportunidade” para aplicarem esse tipo de golpe.
Em 26 de setembro de 2022 uma série de postagens colocando em dúvida a distribuição de marmitas de uma organização chamada Alimentando Necessidades tomou conta do Twitter, subindo a hashtag #marmitagate para os trends topics da plataforma.
Isso aconteceu porque internautas começaram a desconfiar do modus operandi das duas coordenadoras do projeto, Duda Poleza e Taynara Motta. As fotos das entregas pareciam sempre próximas ao restaurante do padrasto de Duda, e a Taynara nunca apareceu de fato em nenhuma rede social.
A forma de atuação também era sempre a mesma. Fazer um post polêmico, que viralizasse, como o que a Taynara contava de uma vizinha que queria doar carne estragada para o projeto, como o de outro post que dava relatos do dia a dia das entregas, em que Duda contava como era abordada pelos moradores de rua, com assédios e outras situações.
Ao final do post, sempre a mesma mensagem: a chave pix de Duda e a descrição do projeto Alimentando Necessidades.
As postagens viralizam porque mexem de alguma forma com quem está lendo. Provoca sentimentos de revolta, engaja o público, e fazer um post viral é uma receita de bolo. Então, centenas de pessoas doavam para o projeto.
Depois de toda confusão, Duda Poleza apareceu em live e começou a responder o público e também disse que o projeto se encerraria por conta de toda polêmica. Ela garantiu a existência da sua sócia Taynara Motta, que logo em seguida teria aparecido em live. O que gerou ainda mais desconfiança, uma vez que um filtro foi aplicado e os internautas encontraram muitas semelhanças entre as duas.
Na quarta-feira, dia 12 de outubro, a Polícia Civil de Blumenau confirmou que Taynara Motta não existe, e que muitos boletins de ocorrência foram abertos pelos doadores. O caso segue sendo investigado.
Além de tratarem os problemas sociais mais complexos, as ONGs também expõem muitas falhas do Estado perante a sociedade. Com isso, inúmeros ataques acontecem, em tentativas desmedidas de descredibilizar as organizações do terceiro setor. E essa é uma prática antiga, que se intensificou nos últimos anos no Brasil.
Em junho de 2022, um vídeo de supostos colaboradores de ONGs retirando ouro da roda de carros na Amazônia viralizou. As mensagens que vinham com ele eram sempre de ataques às organizações que atuam pelo meio ambiente. Foram necessárias investigações e o Portal G1 publicou um artigo mostrando que o vídeo não passava de uma fake news.
Casos como esse e o "marmita gate" dá mais insumos para que pessoas mal intencionadas distribuam mensagens que colocam em dúvida todas as organizações do terceiro setor, e prejudiquem, sobretudo, a captação de recursos.
Em julho de 2022, a criminalização das ONGs no Brasil foi denunciada no fórum da ONU. E além dos danos diretos com agentes doadores, as ONGs também podem ficar à mercê de passivos fiscais e administrativos, processos burocráticos que podem impedir o funcionamento delas.
Aqui no Portal do Impacto, você encontrará artigos que falam sobre comunicação. E se blindar contra os danos causados pelos golpes de doação, é também atuar com uma comunicação eficiente.
Isso porque é por meio dela que a organização vai demonstrar a sua atuação diária, dar nomes aos integrantes do projeto e trazer mais segurança e proximidade não só para os doadores, mas para qualquer tipo de fiscalização.
Na série Governança de A a Z, a especialista Karen Lassner fala sobre responsabilização e prestação de contas. Ela diz assim: “Uma pergunta que surge é “por que a responsabilização e a prestação de contas é importante para o Terceiro Setor?” As ONGs se fundam sob o princípio de que os cidadãos têm o direito de se associarem livremente. O Brasil reconhece esse direito em sua Constituição, através da legislação. Confirma-o ao estender o apoio financeiro direto ou indireto às ONGs, por meio da isenção total ou parcial dos impostos. Em troca desse apoio, as ONGs se comprometem a empreender atividades que atendam às necessidades comunitárias ou públicas, em vez dos interesses privados de lucros dos proprietários ou acionistas. Uma vez que se beneficiam direta ou indiretamente do apoio público, as ONGs terão que demonstrar alto grau de responsabilidade pelos seus atos e na prestação de contas, às suas comunidades de interesse.”
Então, outro ponto importante é criar formas de prestar contas para a sociedade, como a construção de um relatório de atividades. Entender que essa é uma obrigação dos atuantes em organizações do terceiro setor.
Evitar danos nesse sentido é se antecipar e demonstrar publicamente a sua causa e a sua atuação frente a ela.
Larissa Dutra é jornalista da Phomenta
Inscreva-se na nossa Newsletter
Participe do nosso grupo no WhatsApp para receber nossos conteúdos em primeira mão
O Portal do Impacto tem o objetivo de compartilhar conteúdos gratuitos para as Organizações da Sociedade Civil (OSCs ou ONGs) e seus empreendedores nos temas de gestão, captação de recursos, tecnologia, comunicação e outros temas relevantes para o Terceiro Setor.
As opiniões manifestadas nos conteúdos de terceiros apresentados neste portal são de exclusividade das pessoas que as manifestaram, não responsabilizando a Phomenta. Todo o conteúdo é orientativo e tende a ser prático, mas recomendamos a procura de especialistas locais para implementação de ações, considerando a realidade da OSC.