Daiany França Saldanha é responsável pelo editorial do Portal do Impacto.
As mulheres são maioria no terceiro setor, mas falta representatividade
Este conteúdo foi produzido por Daiany França Saldanha
Quantas ONGs você conhece que foram fundadas ou são lideradas por mulheres?
Eu conheço muitas. Inclusive, eu mesma criei uma ONG no Ceará, hoje liderada por outras três mulheres.
A
Phomenta
é outro exemplo. A organização, responsável pelo
Portal do Impacto, foi fundada em 2015 pela empreendedora social
Izadora Mattiello. Também na Phomenta, tem sido perceptível o maior participação de mulheres nos seus programas de capacitação de ONGs.
E fora da minha bolha, o que as pesquisas dizem?
O estudo
“Perfil das organizações da sociedade civil no Brasil”, relativo ao ano de 2017 e realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), mostra que
as mulheres representam 65% das pessoas assalariadas no setor sem fins lucrativos.
A pesquisa “Perfil das Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público em Atividade no Brasil”, também do Ipea (2020), apresenta que
as mulheres são as mais empregadas pelas ONGs
que têm títulos de Organização Social (OS) ou Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip): cerca de 72% nas OS e 64% nas Oscip.
As mulheres também são mais propensas a realizarem doações, de acordo com a pesquisa “Brasil Giving 2021: Um retrato da doação no Brasil”, e fazem mais trabalhos voluntários do que os homens, segundo a publicação “Outras formas de trabalho”, do IBGE (2019). Este comportamento também pode ser percebido nos programas de voluntariado corporativo da Phomenta.
Saiba mais:
Por que as mulheres são maioria no Terceiro Setor?
Mas a participação das mulheres no terceiro setor não se reflete em representatividade.
O terceiro setor é um microscópio da nossa sociedade, ou seja, também
apresenta disparidades salariais entre homens e mulheres; barreiras em relação à raça, etnia, gênero e sexualidade; discriminação em relação às mulheres que são do Norte ou Nordeste; mais obstáculos quando se trata das mulheres ascenderem a cargos de gestão e liderança; assédio e outras violências de gênero.
Historicamente, as mulheres exercem ocupações que remetem ao cuidado e serviços que são menos valorizados socialmente. E a
pesquisa do Ipea, a primeira citada no início do texto, confirma essa reflexão em relação ao 3º setor: “em relação às ocupações, auxiliares de escritório, assistentes administrativas, faxineiras, bem como as atividades vinculadas à enfermagem, totalizam mais de um terço dos vínculos de trabalho em OSCs.”.
Na pesquisa do IBGE, Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos (Fasfil),
vemos que as mulheres ganham em média 76% da remuneração dos homens. Sobre remuneração, o
levantamento da Abong sobre a empregabilidade das pessoas negras em ONGs apresentou que “enquanto os homens brancos têm a maior participação (44,92%) na faixa dos salários mais altos – mais de 20 salários mínimos – as mulheres negras são a maioria nas faixas que representam os menores salários. As mulheres brancas, com maior participação na faixa média – de meio a três salários mínimos –, ganham mais que os homens negros e as mulheres negras”.
Quando falamos de cargos de lideranças, ainda que exista uma aparente paridade entre homens e mulheres no terceiro setor, as mulheres negras são sub-representadas (Censo GIFE 2020) –
e aqui é aparente mesmo, porque quando falamos de “Brasis” não podemos olhar somente para o Sudeste.
Leia também:
Onde estão os negros no campo de impacto?
E se quisermos olhar dados do terceiro setor sobre mulheres lésbicas, bi, trans e travestis (LBTs), mulheres com deficiência, indígenas e quilombolas ou mulheres de outros grupos minorizados, não encontraremos dados. E se encontrarmos, provavelmente serão dados restritos e enviesados, o que fortalece a mensagem trazida no título deste texto: as mulheres são maioria no terceiro setor, mas nos falta representatividade.
Agora que o cenário está posto, cabe a nós, profissionais do terceiro setor e de fora dele, mudar essa realidade. É verdade que ela já vem mudando – as pesquisas e estudos também apontam para isso –, mas
ainda falta muito para uma transformação profunda e sistêmica a favor das mulheres no Brasil.
Última dica: ouça o episódio “As mulheres e o terceiro setor” do podcast
“A que se faz, AQUI SE DOA!”.
Você gosta desse tipo de assunto? Se sim, manda um recadinho pra mim:
daiany@phomenta.com.br.
Revisão: Flávia D'Angelo (Phomenta).
Fontes:
Abong “Quantos somos?”: https://abong.org.br/wp-content/uploads/2020/11/Pesquisa-Abong-Quantos-Somos-1.pdf
Brasil Giving 2021: Um retrato da doação no Brasil:
https://sinapse.gife.org.br/download/brasil-giving-2021-um-retrato-da-doacao-no-brasil
IBGE - Outras formas de trabalho (2019):
https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id=2101722
IBGE - Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos (Fasfil):
https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101647.pdf
IPEA - Perfil das Organizações Sociais e Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público em Atividade no Brasil:
https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/201230_ri_perfil_organizacoes.pdf
IPEA - Perfil das organizações da sociedade civil no Brasil:
https://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/livros/livros/180607_livro_perfil_das_organizacoes_da_sociedade_civil_no_brasil.pdf
Censo GIFE 2020:
https://sinapse.gife.org.br/download/censo-gife-2020
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